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Encerramento

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   Passados quase sete séculos, a humanidade está envolvida em uma nova pandemia, que também deixará marcas profundas nas “memórias do mundo”. Após tanto tempo, mesmo com inúmeros aperfeiçoamentos tecnológicos e científicos – de avanços significativos nas diferentes áreas do conhecimento (Medicina, Química, Biologia...) – parece que continuamos a mercê do mundo invisível dos micro-organismos. O surto de Covid-19 tomou o mundo de assalto, gerando surpresa, insegurança e medo, por ser pouco conhecido e por não existir prevenção (vacina), tampouco medicação, de eficácia científica comprovada, contra seus efeitos, muitas vezes letais.  A aparição do novo Coronavírus serve para nos lembrar, de forma contundente, que não estamos sozinhos neste mundo e que também não somos a parte mais importante da “criação”, como gostamos de pensar. Os humanos sempre geraram impacto sobre a natureza e da mesma forma sofreram suas consequências. A História conta com milhares de anos de sobrevivência a doenças contagiosas mortíferas, em grande parte geradas por desequilíbrios naturais. Entretanto, o tempo passado parece não ter sido suficiente para reconhecermos as nossas responsabilidades com a Vida, continuamos com dificuldades em admitir o impacto que nossos atos geram no ambiente, minimizando a gravidade de situações de risco extremo. Permanecemos buscando bodes expiatórios, que possam ser perseguidos e culpados, aliviando pressões sociais geradas em momentos de crise. Tanto faz responsabilizar o complô judeu medieval ou o atual complô comunista chinês, ambos são condenados por “envenenar o mundo”. 
   Atitudes para controlar a Peste, nos séculos XIV e XV, como a crença em orações, missas, relíquias, procissões e o medo da Ira Divina, embora ineficazes contra a Peste Bubônica, tinham suas razões e fundamentos.  Na sociedade medieval, a água de rosas, o vinagre, as fogueiras, os fortes incensos e perfumes eram elementos importantes, a partir da Teoria dos Humores, que regia a medicina do período. Além disso, é fundamental ressaltar o completo desconhecimento dos micro-organismos e da Teoria Bacteriana de contágio. Contemporaneamente, a nova pandemia demonstrou reações muito semelhantes, sobrepondo a fé ao conhecimento científico. Diante da Covid-19, somos alcançados pela crença em medicamentos salvíficos milagrosos das mais diferentes origens, tanto caseiros como provindos da indústria química, mesmo sem qualquer comprovação científica de eficácia. Desde a Antiguidade, o isolamento sempre foi a medida recomendada para evitar a propagação de doenças contagiosas. Nos séculos XIV e XV, a “Lei da Peste” foi reeditada, quando foram institucionalizados os lazaretos, as quarentenas e os regimentos contra as pestilências. Atualmente, séculos de conhecimento sobre o potencial de contágio entre as multidões parecem ser ignorados e mesmo ridicularizados. A Grande Peste devastou a Ásia, a Europa e o norte da África no final da Idade Média, condenando este período como “A Idade das Trevas”. Essas populações lutaram por sobrevivência com as medidas e crenças que dispunham, sem nem mesmo sonhar com os recursos e conhecimentos que agora disponibilizamos. Entretanto este distanciamento temporal e (bio)tecnológico não nos isentou de comportamentos muito semelhantes. Na atualidade, convivemos com autoritarismos, radicalismos, negacionismos, supervalorização de crenças espirituais, ignorância orgulhosa, menosprezo pelo conhecimento cientifico e, por fim, “a Peste”... Nessa trajetória histórica, de séculos passados, de rupturas, transformações, permanências e semelhanças, resta o questionamento: “Idade das Trevas”, qual período melhor a representa?

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